O Trabalho dos Policiais Rodoviários Federais Perante as Demandas que Envolvem Suicídio

Mariana Kohl Pegoraro

Liana Bohrer Berni

 

Introdução

 

O trabalho carrega consigo um labor e um propósito. Assim, labor possui dois extremos: o físico e o intelectual. Por vezes, ambos andam juntos para obter o sucesso da tarefa, que tem ligação com o propósito, contemplando as aspirações do homem. Isso posto, o trabalho necessita de uma energia empregada para alcançar o resultado esperado, estando nesse processo, compreendidos: consciência, finalidade, entusiasmo e até aflição (Albornoz, 2008). Dessa forma, o trabalho faz parte da vida do ser humano, não somente como meio de subsistência, mas também enquanto realização pessoal. Por conseguinte, o emprego, na sociedade contemporânea, tem passado por alterações devido ao avanço da tecnologia, diferentes arranjos de trabalho e a transformações nos valores organizacionais. É nesse sentido que o trabalho abrange aspectos positivos e negativos, originando prazer, mas, ao mesmo tempo, causando sofrimento (Kubo & Gouvêa, 2012). Situações de suicídio podem ter, muitas vezes, dentre outros fatores, ligação com relações conflituosas que o indivíduo mantém no trabalho, relacionamentos interpessoais, provido de altos níveis de sofrimento psíquico, culminando em um ato de autoaniquilação. Sendo assim, a prevenção e promoção de saúde são elementos fundamentais para a valorização da vida (Moreira & Bastos, 2015). A vigente pesquisa visou conhecer a realidade do trabalho de uma unidade operacional (UOP) da Policia Rodoviária Federal (PRF) do sul do Brasil e como se dão os atendimentos a ocorrências de tentativa de suicídio em determinada ponte da rodovia. Ademais, buscou identificar a visão dos policiais rodoviários federais sobre o suicídio e entender a abordagem deles perante ocorrências de tentativa de suicídio e compreender como tais demandas afetam o trabalho desses profissionais. Diante da especificidade da UOP em estudo, notou-se a relevância de se obter um maior entendimento do trabalho dos policiais rodoviários federais, assim como a compreensão do modo como manejam ocorrências dessa natureza, de como elas influenciam o trabalho, a saúde física e mental deles.  O intuito também foi explorar a relação entre trabalho da PRF e seu trabalhador, bem como os meios utilizados para que esses policiais não se tornem vítimas dos elementos disfuncionais presentes no exercício do trabalho já que as demandas de suicídio podem afetar a saúde mental desses colaboradores. Decorrente disso, essa problemática traz à tona a importância de se enaltecer o foco nas individualidades dos empregados, elaborar estratégias que louvam o bem-estar e a saúde dos sujeitos (Santos, 2015). O problema dessa pesquisa surgiu a partir de demandas levantadas no campo de estágio da psicologia. Desse modo, durante o estágio, destacou-se como marcante característica dessa UOP os frequentes atendimentos a casos de tentativa de suicídio em determinada ponte da rodovia. O presente estudo realizou uma pesquisa com caráter qualitativo, exploratório e de campo. Foram realizadas entrevistas com oito colaboradores da Polícia Rodoviária Federal e analisadas por meio de análise de conteúdo. Os desfechos apresentam que os policiais possuem inúmeras tarefas e atividades da função, assim como ocorrências de suicídio e ideação suicida em uma ponte próxima da unidade operacional são frequentes. Os dados revelaram que esses servidores públicos não possuem um treinamento específico para atender as demandas de suicídio e todas as situações são registradas como auxílio ao enfermo. Os atendimentos referentes ao suicídio implicam diretamente na saúde mental desses colaboradores. Em sua maioria, acreditam que o suicídio está vinculado ao sofrimento psíquico do sujeito, problemas pessoais e desesperança. Isso posto, a profissão possui uma rotina de trabalho diferenciada, de suma importância para a sociedade. Assim, concebe-se que os policiais executam a prevenção e promoção de saúde, sendo peças essenciais para a valorização da vida. Segundo as entrevistas, demandas de suicídio atendidas na ponte próxima a Uop são características dessa unidade da PRF, pois existe uma ponte muito alta na rodovia da área da atuação do posto da PRF.  Já que, em sua formação não recebem preparo para esse tipo de ocorrência, essa atividade gera ansiedade, sentimento de impotência e incapacidade. Logo, surge a angústia nos policiais por não saberem se estão procedendo de modo correto e tomando atitudes certas nas ocorrências de tentativa de suicídio na ponte, mas também quando abordam esse usuário na Uop com intuito de ir até a ponte. Outrossim, os policiais rodoviários federais, ao atender as ocorrências, procuram exercer seu dever como policial rodoviário federal em salvar vidas nas rodovias federais. Na maioria das vezes, obtêm sucesso na preservação da vida na ponte próxima da Uop, onde realizam uma conversa com o indivíduo que está tentando cometer o suicídio no local, empenhando-se em convencer o sujeito a não findar com a própria vida. Isso ocorre sem uma capacitação específica da PRF para essas demandas. Depois, levam o indivíduo para a Uop, entram em contato com responsável ou familiar da pessoa e, quando não há contato, chamam o SAMU para levar o usuário ao hospital.  Ao ouvir os relatos durante as entrevistas sobre atendimentos às ocorrências de suicídio, assim como outras demandas de trabalho, nota-se a importância de um profissional da psicologia nesse ambiente para auxiliar os policiais e amparar os usuários. Do mesmo jeito, faz-se relevante ter psicólogo para realizar um trabalho de suporte ao sofrimento no trabalho e desenvolver estratégias de reconhecimento. Assim, evidencia-se uma necessidade de rever a formação desses profissionais, como também a importância de oferecer um suporte psicológico a esses trabalhadores por meio de convênios com psicólogos e clínicas multiprofissionais para zelar da saúde como um todo desses policiais.

 

Referências

 

ALBORNOZ, Suzana. O que é trabalho. São Paulo: Brasiliense, 2008. 

KUBO, Sergio Hideo; GOUVÊA, Maria Aparecida. Análise de fatores associados ao significado do trabalho. Rev. Adm. (São Paulo), São Paulo, v. 47, n. 4, p. 540-554, Dec.  2012 .

MOREIRA, Lenice Carrilho de Oliveira; BASTOS, Paulo Roberto Haidamus de Oliveira. Prevalência e fatores associados à ideação suicida na adolescência: revisão de literatura. Psicologia Escolar e Educacional, v. 19, n. 3, p. 445-453, 2015.

SANTOS, F. C. O.; CALDEIRA, P. A Psicologia Organizacional e do Trabalho na Contemporaneidade: As Novas Atuações do Psicólogo Organizacional. Psicologia.pt – O Portal do Psicólogo. 2015. Retrieved from http://www.psicologia.pt/artigos/ver_artigo.php?a-psicologia-organizacional-e-do-trabalho-na-contemporaneidade-as-novas-atuacoes-do-psicologo-organizacional&codigo=A0929&area=d8