Perfil do Servidor com Deficiência de uma Universidade Federal – Avaliação pela Equipe Multiprofissional SIASS

Deivson Cavalcante de Oliveira 1
Francinese Raquel Vieira Silva 2
Priscila Tavares de Oliveira 3
Sandra Maranhão Cordeiro Sousa 4
 
Introdução

Segundo os dados do último censo realizado pelo IBGE (2010), aproximadamente 24% da população apresenta algum tipo de deficiência ou alguma limitação funcional. Contudo, uma boa parcela desta população não está devidamente inserida no mercado de trabalho considerando que apenas 4% estão vinculadas a algum emprego formal.
Observa-se que políticas afirmativas instituídas no Brasil por meio do Decreto Lei 3298/1999 e o Art 5º §2 da Lei 8112/90 criaram mecanismos com a finalidade de assegurar uma maior participação de pessoas com deficiência no mercado de trabalho na iniciativa privada e no serviço público, respectivamente. Entretanto, a inclusão destas pessoas no trabalho ocorre, muitas vezes, em atendimento a um percentual mínimo de funcionários previsto na legislação vigente sem que haja a devida adequação das condições e tarefas laborativas às necessidades destes trabalhadores, considerando sua funcionalidade e as limitações presentes em decorrência da deficiência.
Pensando nisto, governos de diversos países e a sociedade em geral têm procurado criar estratégias que estimulem o potencial laborativo de pessoas com deficiência, considerando que representam progressivamente um maior número de pessoas em idade laborativa (PRANSKY, 2014).
Para tanto, faz-se necessário conhecer o perfil da funcionalidade deste grupo de trabalhadores para que sejam adotadas medidas que contribuam para minimizar eventuais barreiras físicas, cognitivas e atitudinais presentes nas tarefas e ambientes de trabalho.
Diante dessa realidade, a equipe multiprofissional da Unidade do Subsistema Integrado de Atenção à Saúde do Servidor (SIASS) passou a adotar o referencial da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) para os atendimentos aos servidores com deficiência na Universidade. Este trabalho tem por objetivo apresentar o perfil dos servidores com deficiência atendidos pela equipe multiprofissional de vigilância e promoção da saúde do servidor da Unidade SIASS.

Metodologia

Trata-se de um estudo do tipo descritivo, transversal e de abordagem quantitativa. Para traçar o perfil da funcionalidade dos servidores com deficiência da Universidade foram utilizados os Laudos de Funcionalidade de 13 servidores emitidos pela Equipe Multiprofissional da Unidade do SIASS, no período de agosto de 2017 a dezembro de 2018.

Marco Conceitual

Os marcos conceituais e legais que referenciam este estudo são o Decreto 3.298/1990 e suas alterações e a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF).
De acordo com o Decreto nº 6949 de 25 de agosto de 2009, pelo qual o Estado Brasileiro ratificou a Convenção Internacional para a Proteção e Promoção dos Direitos e Dignidade das Pessoas com Deficiência, entende-se por deficiência a condição das pessoas que apresentam impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Neste sentido, a deficiência é compreendida como um produto das perdas de funções do corpo associadas a presença de barreiras ambientais e atitudinais presentes na sociedade que restringem a participação destes indivíduos em atividades de lazer, trabalho, educação, dentre outras.
De acordo com Guimarães (2011), o processo de inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho é um desafio complexo no qual são frequentes a falta de treinamento profissional destes trabalhadores, a presença de barreiras arquitetônicas e organizacionais e o preconceito quanto ao seu potencial laborativo.
A CIF, aprovada em 2001 pela Organização Mundial de Saúde, proporciona o uso de nova linguagem ao trabalho desenvolvido no âmbito da saúde do servidor. Essa classificação auxilia na descrição da funcionalidade e da incapacidade relacionadas às condições de saúde, referenciando aspectos como “Funções e Estruturas do corpo”; “Atividades e Participação” e os “Fatores Ambientais”. Trata-se de uma abordagem que não foca apenas nas consequências da doença, buscando detalhar a saúde pela perspectiva individual, biológica e social em constante interrelação.
Desta forma o uso da CIF amplia o entendimento da funcionalidade e das limitações apresentadas pelo indivíduo para além da condição de saúde que caracteriza a sua deficiência , tendo como referência a utilização de um modelo biopsicossocial. Segundo Di Nubila e Buchalla (2008), a CIF promove uma mudança paradigmática do eixo da doença para o eixo da saúde, permitindo entender a condição de saúde (funções e estruturas do corpo) dentro de contextos específicos (atividade/participação e fatores ambientais e pessoais).

Resultados

Os resultados encontrados apresentaram seguinte perfil de servidores com deficiência: a maior incidência está no sexo masculino (11), com maior prevalência na faixa de idade dos 21 aos 39 anos (8). O quantitativo de cargos e servidores foram: auxiliar/ assistente em administração (5), docentes (3), técnicos em assuntos educacionais (3), Administrador (1) e Técnico em Refrigeração (1).
Quanto aos componentes da CIF sobre as Funções e Estrutura do Corpo, a maior prevalência de deficiência relaciona-se à visão e suas funções (8), seguida das funções das articulações e ossos (3) e funções auditivas e vestibulares (2).
Em relação ao componente de Atividade e Participação, 4 servidores apresentaram comprometimentos de forma grave ou total em itens da funcionalidade relacionados a este domínio, 3 servidores apresentaram moderado comprometimento e 4 servidores leve. As limitações de atividades e restrições à participação estiveram relacionadas com a mobilidade (3), interações e relacionamentos interpessoais (3), aprendizagem e aplicação de conhecimento (2) e interações e relacionamentos interpessoais (2).
No componente dos fatores ambientais usa-se os qualificadores de 0 a 4 para avaliar a situação apresentada pelo servidor. Na especificação dos qualificadores, tem-se o “0” para nenhum obstáculo; “1” para obstáculo leve; “2” para obstáculo moderado; “3” para obstáculo grave e “4” para obstáculo completo.
Desta forma, foram identificadas barreiras em 10 servidores, relacionadas aos fatores ambientais, sendo que 4 servidores apresentaram obstáculos na forma completa ou grave, 7 servidores relataram obstáculos moderados e 3 leves. Os obstáculos mais citados relacionam-se à apoio e relacionamentos, bem como ao acesso a Serviços, sistemas e políticas relacionados com a saúde.
Ainda no componente relacionado aos fatores ambientais, identifica-se pontos facilitadores com qualificadores similares aos dos obstáculos, sendo: “0” para nenhum facilitador; “1” para facilitador leve; “2” para facilitador moderado; “3” para facilitador grave e “4” para facilitador completo.
Identificaram-se 9 servidores com facilitadores completos relacionados à acesso aos Serviços, sistemas e políticas relacionados com a saúde; 2 servidores com facilitadores graves relacionados à Produtos e tecnologias para uso pessoal na vida diária; Produtos e tecnologias de apoio para a comunicação e 2 servidores com facilitadores moderados relacionados à Apoio e relacionamentos; Serviços, sistemas e políticas relacionados com a saúde.
Ressalta-se que alguns itens se repetem, porque são adaptáveis à realidade de cada servidor. Por exemplo, o acesso a serviços, sistemas e políticas relacionadas à saúde pode ser um obstáculo completo para o servidor que precise fazer uso dos serviços e não tenha plano de saúde ou não tenha conseguido vaga nos serviços do Sistema Único de Saúde. Assim, para aquele servidor que tem pleno acesso a esses serviços, esse item passa a ser o facilitador completo, visto que colabora com sua qualidade de vida.
Após as avaliações, constatou-se que todos os servidores acompanhados pela Equipe Multiprofissional apresentaram compatibilidade entre a deficiência e as atribuições das tarefas inerentes ao cargo. No entanto foram realizadas intervenções pela equipe multiprofissional na atividade exercida por 7 servidores: adequações no posto de trabalho, utilização de tecnologias assistivas, orientação sobre necessidade de concessão de horário especial, orientações educativas ao servidor, chefia e colegas, e administrativas.

Considerações Finais

As avaliações dos servidores com deficiência consistem em um trabalho que colabora com as avaliações do estágio probatório e com o bom desempenho laboral destes servidores, considerando que identifica possíveis barreiras ambientais ou atitudinais além das limitações funcionais que podem comprometer o desempenho de suas atividades.
Portanto, o papel da Equipe Multiprofissional no acompanhamento de servidores com deficiência tem como objetivo avaliar a compatibilidade das tarefas exercidas pelo servidor com o grau de funcionalidade que o mesmo apresenta em decorrência de sua deficiência; as condições de acessibilidade do ambiente de trabalho, e a necessidade de uso de tecnologias assistivas e de eventuais adaptações em tarefas e postos de trabalho. Neste sentido a utilização da CIF proporcionou uma linguagem comum entre os profissionais da equipe e um olhar integral sobre a saúde e a funcionalidade de servidores com deficiência.

Referências

BRASIL. DECRETO Nº 3.298, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1999. Regulamenta a Lei n o 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências.
BRASIL. Lei nº 8.112/90. Disponível em <http://www.planalto.gov/ccivil_03/LEIS/L8112cons.htm>. Acesso em 19 de agosto de 2018.
Organização Mundial da Saúde. CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. Trad. do Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde para a Família de Classificações Internacionais. São Paulo: EDUSP; 2003.
PRANSKY, G. Lisa Schur, Douglas Kruse, and Peter Blank: People with Disabilities: Sidelined or Mainstreamed? J. Occup. Rehabil., v.14, p. 171-172, 2014.

1 Fisioterapeuta do trabalho da Unidade SIASS/UFAL, mestrando em Ergonomia (UFPE).
2 Assistente social da Unidade SIASS/UFAL, mestranda em Ensino na Saúde (UFAL). 
3 Psicóloga da Unidade SIASS/UFAL.
4 Médica do trabalho da Unidade SIASS/UFAL. 
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