Programa Viva Sempre Bem: Uma Iniciativa de Sucesso

Carla Cristina Burmann1, Marcio Alex K. Rocha1, Sibele Faller2, Felipe Scuciatto2, Adonis Valenti3, Ana Carolina Peuker2

Resumo

Evidencia-se um crescimento substancial da morbidade e mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis (DCNT’s). Um importante fator de risco comum a esse grupo de doença é constituído por um estilo de vida não saudável (sedentarismo, tabagismo, má alimentação, etc). Diante disso, as empresas têm enfrentado sérias dificuldades com o aumento dos custos de assistência médica. No Brasil a sinistralidade – que abarca despesas médicas, hospitalares e laboratoriais – tem aumentado sistematicamente acima da inflação.
A implantação de programas de bem estar e qualidade de vida no ambiente corporativo e promoção da saúde proporciona aos integrantes maior resistência ao estresse, maior ajustamento emocional, mais motivação, maior eficiência no trabalho, melhor autoimagem e melhor relacionamento. Além disso, a organização se beneficia com uma força de trabalho mais sadia, com menor absenteísmo/presenteísmo/turnover, menor número de acidentes, menor custo de saúde assistencial, maior produtividade, maior moral do staff e, por último, um melhor ambiente de trabalho (Baicker, Cutler, Song, 2010; Melnyk, Amaya, Szalacha & Hoying, 2016). A necessidade de redução dos custos com assistência médica, melhoria na produtividade e o aumento galopante das taxas de mortalidade por Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT’s) são fatores que motivaram o Programa Viva Sempre Bem (PVSB).
O PVSB trata-se de um conjunto de ações, embasadas cientificamente, orientadas para aumentar a saúde e o bem estar de integrantes de uma planta petroquímica, situada no Rio Grande do Sul (RS). As ações do PVSB foram planejadas com caráter preventivo, superando o antigo modelo unicamente centrado na assistência curativa. Por meio de intervenções baseadas em evidências o plano de ação foi conduzido e direcionado às necessidades de cada participante. O estudo teve delineamento observacional longitudinal com follow-up após seis meses. O objetivo foi implementar o PVSB e comparar duas avaliações em saúde (Health Risk Apraisals -HRA e recoleta) para verificar a efetividade das intervenções em saúde propostas.
Inicialmente, foi realizado um estudo epidemiológico para contemplar a avaliação dos riscos de saúde da população em análise (HRA) e, assim, estratificar o risco para DCNT’s da população em estudo (alto, médio e baixo) (N=283). O diagnóstico e avaliação dos marcadores de risco para DCNT’s foi feito através de protocolos validados pela OMS e outros órgãos de referência em saúde. A coleta de dados ocorreu em formulário eletrônico (tablet) e utilizou dados oriundos de exames periódicos dos participantes.
Com base nos resultados do levantamento, foram implantadas ações estratégicas, através de metodologia pioneira e inovadora, para rastrear e reduzir os fatores de risco para DCNT’s. Desenvolveu-se um software, que permitiu o uso de prontuários eletrônicos para compartilhamento de informações entre a equipe de saúde, além do efetivo gerenciamento de dados de saúde dos integrantes. Por meio da ferramenta de Business Inteligence foram aplicados algoritmos que cruzaram variáveis críticas e geraram indicadores úteis para a tomada de decisão em saúde pelos gestores. Buscou-se, além de informar, estimular e motivar, desenvolver ferramentas e oportunidades para que mudanças sustentáveis no estilo de vida dos participantes fossem obtidas. Após a realização da HRA e da análise de dados, cada participante recebeu uma carta personalizada com os principais resultados de sua avaliação e com o convite para consultar com o gerente de casos.
O Plano de Ação Estratégico do PVSB foi desenvolvido com base no levantamento epidemiológico inicial e respaldou-se na Prática Baseada em Evidência (PBE), definida como a utilização das melhores evidências disponíveis para a tomada de decisões custo-efetivas em saúde. As ações que integram o PVSB se originaram das melhores práticas em saúde evidenciadas no âmbito internacional. Neste contexto, foram selecionados metodos inovadores e pioneiros no Brasil para atingir os objetivos propostos. O Gerenciamento de Casos (Case Management) – um tipo de aconselhamento para o estilo de vida saudável realizado por profissional capacitado – e o Contingency Management (Gerenciamento de Contingências) – reforçamento do comportamento saudável através de um programa de benefícios – estão no eixo central do PVSB.
O Gerenciamento de Casos (GC) é um método empregado para aumentar a adesão à serviços de saúde e favorecer a integração dos recursos oferecidos. É um processo orientado para a avaliação, planejamento, monitoramento e articulação de uma rede de serviços (externa e interna). O GC promove suporte contínuo para motivar e ajudar pessoas a acessarem os recursos de que necessitam para mudança de estilo de vida não saudável e adesão ao plano terapêutico. Desta forma, os participantes podiam melhorar indicadores de saúde, aumentar produtividade e o bem estar e a qualidade de vida. Por meio do GC foi possível acompanhar a trajetória de cada indivíduo através do monitoramento dos prontuários e agendamentos, bem como de reuniões com a equipe de saúde. As sessões com o gerente de casos (Psicólogo) permitiram organizar objetivos e trabalhar questões individuais não contempladas em outros momentos com a equipe. Esses encontros auxiliaram os integrantes a eliminarem obstáculos que tipicamente impedem a adesão ao tratamento.
Desenvolveu-se também um Programa de Benefícios, baseado no Gerenciamento de Contingências (Contingency Management), um modelo teórico proveniente da Psicologia Comportamental. Esta ação estratégica foi proposta para aumentar a adesão aos serviços de saúde e a motivação para um estilo de vida saudável. Os comportamentos alvo, selecionados para serem reforçados – através de troca por prêmios em uma loja virtual disponibilizada no Portal do PVSB, a seguir detalhado – foram: realização de periódicos em dia; participação nas avaliações de saúde; frequência nas consultas com os profissionais de saúde; adesão a serviços e participação em eventos de saúde de Saúde, Segurança e Meio Ambiente (SSMA).
O portal de gestão do PVSB foi criado com o objetivo de facilitar a gestão de dados, o acesso às informações de saúde, bem como agendamentos mais ágeis e gestão do programas de benefícios. Todos os integrantes participantes, bem como gestores e prestadores de saúde tiveram acesso aos recursos do portal. O desenvolvimento do portal baseou-se o modelo de Gerenciamento de Risco, considerando as variáveis que compõe o risco; incluindo variáveis críticas (ex. antecedentes, hábitos de saúde, dados de exames clínico e laboratoriais, diagnóstico, saúde mental); determina nível de risco (baixo, médio, alto); sugere áreas de intervenção e periodicidade do cuidado, considerando cada componente de risco e o nível de risco aferido. O portal permite as seguintes visões: a) Usuário: visão de áreas problema (alertas de risco), acompanhamento do seu progresso terapêutico, pontuação do programa de incentivos (loja virtual), dicas de saúde, agenda. Ao acessar o portal, os integrantes conseguiam visualizar seu grau de risco, quais fatores estão presentes e sua evolução durante as diferentes avaliações; b) Assistência (equipe de saúde): acesso compartilhado às informações clínicas e do programa de incentivos; respaldando a tomada de decisões da equipe assistencial e operacionalizando a agenda e c) Gestão: ferramenta de Business Inteligence, gerando indicadores globais e relatórios específicos - desde nível individual até populacional.

Figura 1: Portal do PVSB (Perfil do colaborador)

Após o levantamento epidemiológico, foram identificados 15 fatores de risco no total, sendo que sete representavam mais de 82% dos casos e oito representavam apenas 18% dos casos. A obesidade e o tabagismo foram os dois fatores com maior incidência, seguido pelo sedentarismo. A análise dos dados revelou que 20% da amostra tinha seis ou mais fatores de risco para DCNT’s, 38% estavam sedentários ou praticavam atividade física insuficientemente e 93% não consumiam frutas e vegetais nas quantidades recomendadas pela OMS.
Os resultados evidenciaram que o PVSB teve uma implantação bem sucedida, pois a adesão foi muito superior a de estudos internacionais. Com a implantação do PVSB, a adesão aos serviços de saúde (in loco) foi altamente incrementada. Este aumento deve-se, possivelmente, a adoção de um sistema de recompensas, baseado nos pressupostos teóricos da psicologia comportamental (contingence management) e do gerenciamento de casos (case management). No primeiro ciclo do programa, 283 integrantes foram avaliados e classificados durante o HRA. Destes, 271 receberam sua devolutivas de saúde e foram convidados à integrar o PVSB. No total, 161 integrantes aceitaram participar do PVSB, representando uma taxa de aceite de 59%.
Ao final do ciclo (após seis meses), 87% dos integrantes completaram seu plano terapêutico e participaram da reavaliação de saúde. Todos os sete principais fatores de risco que representam mais de 82% dos casos tiveram percentual significativo redução, após o período de seis meses. Destaca-se a a redução dos seguintes fatores: Sedentarismo (menos15.5%); Tabagismo (menos 15,2%); Dieta  não sadia (menos 10,7%)e sobrepeso (menos 7,5%).

Figura 2: Percentual de redução dos principais fatores de risco (6 meses)

Foi observado um acréscimo de 61,9% no número de horas de atividades físicas semanais, de 123% no número de integrantes ativos na academia e de quase 26% no número de frutas e legumes consumidos semanalmente. Quanto à classificação de risco, pós a recoleta, foi observada uma queda de 71% nos integrantes classificados como alto risco. Também foi observada uma queda de 9% nos classificados como médio riscos. Estas quedas refletiram no aumento de 73% no número de integrantes classificados como baixo risco.

Figura 3: Distribuição do grau de risco

Quanto ao absenteísmo absoluto (expresso em horas), que representa o que é esperado que o colaborador trabalhe, constatou-se uma queda de 35,01% no número médio de horas não trabalhadas e uma redução de 41% na média de faltas por problemas de saúde. Na recoleta, foi observada uma melhora na percepção de desempenho do colaborador. O índice passou de 81,90% para 85,20%, indicando uma redução no presenteísmo, que corresponde à diminuição da efetividade do funcionário presente.

O gerenciamento de casos foi essencial para obtenção dos resultados. Ao todo, o gerente realizou 452 atendimentos, totalizando mais de 250 horas de atendimento em 6 meses. Cerca de 74% do integrantes realizaram três ou mais atendimentos. O programa de benefícios também se mostrou uma estratégia de sucesso, com 136 participantes atingindo a pontuação mínima para troca.  Entre os itens mais procurados estavam cadeiras de praia, jogos de frescobol e toalhas. O programa também distribui benefícios como voucher para cinema, reembolso para compra de artigos esportivos e hospedagem, entre outros. Os resultados sugerem que as estratégias adotadas favoreceram a melhoria dos indicadores de saúde dos integrantes, revelando que o PSVB é um case de sucesso e que sua metodologia pode ser replicada.

Depoimentos de alguns participantes do PVSB:

O projeto Viva Sempre Bem é de grande importância para minha saúde. Quando lançaram o projeto, achei interessante o acompanhamento de profissionais de distintas áreas como: Educador Físico, Nutricionista, Fisioterapeuta, Psicólogo, Gestor de Caso e Medico todos voltados para me ajudar a levar uma vida saudável. Outro beneficio do projeto, é realizado uma pontuação para quem não falta as consulta e segue as recomendações dos especialista. Os participantes acessam o site e pode entrar na loja virtual e trocar os pontos adquiridos por várias opções, isto serve de incentivo para permanecer no projeto. Fico feliz em ver o resultado que estou atingindo no projeto e ver a preocupação da empresa com minha saúde hoje e amanhã.”

O Projeto é uma ação maravilhosa que está transformando meus hábitos e mostrando os benefícios das boas escolhas relacionadas a saúde. Já nas primeiras semanas, foi possível perceber que dedicar um tempo para atividade física refletiu em aumento da produtividade e redução da ansiedade. Algumas destas boas escolhas também foram adotadas por meus familiares e demais Integrantes da minha área. Ao aderir ao Projeto, me senti lisonjeada em trabalhar em uma empresa preocupada em cuidar do meu bem-estar e que ainda me ensina a importância de me cuidar.”

Diante disso, pode-se concluir que a mudança sustentável para um estilo de vida saudável, tendo a saúde integral como um valor, orientando os indivíduos a realizarem escolhas sadias de forma autônoma e a identificarem recursos que beneficiassem sua qualidade de vida foi um importante resultado desse projeto. Além disso, houve uma utilização mais assertiva da rede externa, evitando que integrantes utilizassem o plano de saúde desnecessariamente, reduzindo custos. Aliar inovação e tecnologia ao processo de gestão, incluindo o monitoramento, coordenação, planejamento fomentou a adesão aos serviços de saúde e o engajamento em comportamentos saudáveis.

O sucesso do PVSB motivou uma segunda rodada dentro da empresa. O programa acontece desde 2012, tendo beneficiado mais de 370 integrantes até o momento. Por meio de um robusto programa de organização e gestão da atenção em saúde, o PVSB contribuiu para diminuição da prevalência dos indicadores de risco para DCNT’s no contexto organizacional. Estas doenças representam um impacto multidimencional, pois afetam o indivíduo em sua saúde e qualidade de vida e a organização em sua força de trabalho e seus custos diretos e indiretos com saúde. Inciativas como esta devem ser estimuladas nas empresas. Os resultados exitosos do PVSB, bem como sua metodologia inovadora, podem replicados em outras organizações beneficiando um número ainda maior de pessoas.


Referências
 

Baicker, K., Cutler, D. & Song, Z. (2010). Workplace wellness programs can generate savings. Health Aff (Millwood). 29(2):304-11. doi: 10.1377/hlthaff.2009.0626.
Melnyk, B.M.; Amaya, M.; Szalacha, L.A. & Hoying, J. (2016). Relationships Among Perceived Wellness Culture, Healthy Lifestyle Beliefs, and Healthy Behaviors in University Faculty and Staff: Implications for Practice and Future Research. West J Nurs Res.38(3):308-24. doi: 10.1177/0193945915615238.
 

1Braskem
2Bee Touch, Gestão, Pesquisa e Inovação em Saúde
3Hospital Moinhos de Vento Empresas

 

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