Presenteísmo em Trabalhadores de uma Indústria

Beatriz Machado de Campos CorrêaSilva1, Aline BedinZanatta2, Igor BenedickCoimbra3, Renata CristinaSobral4, Graziella Ferrari deMedeiros1, Ana Carolina LemosPereira2, CelsoStephan5, Sérgio Roberto deLucca5


Introdução
A ausência do trabalhador em seu posto de trabalho por doença ou por outros motivos é denominado absenteísmo, e é amplamente estudado, sendo considerado um relevante indicador para determinar a saúde de uma organização devido à antiga e errônea concepção de que a presença do trabalhador no posto de trabalho garante produtividade da empresa.
 
Atualmente é de fundamental importância considerar que os trabalhadores venham trabalhar ainda que doentes. Estes trabalhadores, nessas condições, são denominados presenteístas. O presenteísmo é difícil de ser detectado e percebido, e por esta razão ainda é considerado um campo em construção na saúde ocupacional.
 
O presenteísmo é considerado um comportamento implícito dos trabalhadores que se sentem ameaçados, inseguros ou em risco de perderem seus empregos havendo tendência de permanecer no trabalho mesmo doentes ou mais tempo do que o necessário como forma de marcar presença e demonstrar compromisso com a organização (BIRON, 2009). O presenteísmo é uma das principais causas de perda da produtividade (QUAZI, 2013).
 
O presenteísmo não é resultado de simulação. Muitos dos problemas de saúde que levam ao presenteísmo não são limitantes, mas se esses problemas de saúde não forem tratados a tempo podem ser cronificados e se tornarem incapacitantes (HEMP, 2009). As pesquisas sobre presenteísmo se concentram nas doenças crônicas ou episódicas (ARAÚJO, 2012).
Nas últimas décadas, estudos têm revelado alta incidência do presenteísmo por doença   (ARONSSON   et   al.,   2000;   ELSTAD   &   VABO,   2008;   HANSEN    & ANDERSEN, 2008). O presenteísmo interfere não somente na produtividade, mas também na qualidade de vida e saúde do trabalhador (LOWEE, 2002).
 
De acordo com levantamentos realizados por Cooper (2011) e por Seligmann- Silva (2010), o medo de perder o emprego é uma das principais causas do presenteísmo.
 
O presenteísmo por doença está relacionado a situações em que os trabalhadores vêm trabalhar doentes ou com outras condições físicas e mentais que diminuem sua produtividade no trabalho (MILANO, 2005), sendo bastante dispendioso para os empregadores (HEMP, 2004).
 
O ambiente de trabalho no qual o trabalhador desenvolve suas atividades  tem grande importância para o desenvolvimento de atitudes presenteístas (DEW et al., 2005). A percepção do que acontece no trabalho, as demandas e possibilidade de controle ou autonomia no trabalho, e a qualidade dos relacionamentos com a chefia e os colegas são muito importantes para o desempenho no trabalho (CAVERLY, et al., 20007).
 
De acordo com Preziotti & Pickett (2006), 60% dos trabalhadores sentem-se pressionados a permanecer no trabalho mesmo quando doentes, fazendo desta a principal causa do presenteísmo. A insegurança no emprego é a explicação mais plausível para quedas bruscas de absenteísmo por doença durante os períodos de demissão ou inatividade (LUZ & GREEN, 1997).
 
Para muitos trabalhadores vir trabalhar doente ainda é considerado a melhor opção, pois não possuem a consciência de estar praticando o presenteísmo (CARVELY et al., 2007). Ramsey (2006) apontou as principais razões dos trabalhadores irem trabalhar mesmo doentes: ‘medo de ser passado para trás’, ‘mentalidade do homem de ferro’, ‘relutância de usufruir da licença médica’, ‘teoria do homem indispensável’, ‘sentimentos de ansiedade’ e ‘sentimentos ambíguos de responsabilidade’.
 
Exposições prolongadas a situações percebidas pelos trabalhadores como estressantes podem causar problemas de saúde. Para alguns trabalhadores que sofrem de estresse físico ou emocional, pode tornar-se difícil manter um bom desempenho no trabalho.
 
De acordo com estudo realizado no Reino Unido, com trabalhadores da saúde constatou que 80% desses profissionais apresentavam elevados níveis de estresse ocupacional e problemas de saúde e evitavam faltar ao trabalho, sendo que 48% dos trabalhadores sentem-se culpados por terem que faltar ao trabalho; 20% temem atitude hostil da chefia, e 18% tem medo de diminuir a produtividade no trabalho (MCKEVITT et al., 1997).
 
As doenças crônicas ou episódicas e os sintomas das doenças são causas frequentes do presenteísmo (HEMP, 2004). Os problemas de saúde mais comumente    associados    ao    presenteísmo    são:    cefaleia,    fadiga, problemas articulares, lombalgias, alergias, asma, problemas gastrointestinais, ansiedade entre outros (ARTEGA et al., 2007).
 
Situações cotidianas que geram estresse no trabalho são reconhecidas como um dos riscos mais sérios ao bem estar biopsicossocial do trabalhador, colocando em risco a saúde dos membros da organização. Alguns autores referem que 50 a 80% de todas as doenças possuem fundo psicossomático ou relação com altos níveis de estresse (BATEMAN & STRASSER, 1983; PELLETIER, 1984).
 
Insatisfação com a vida, com o trabalho, e problemas de saúde e estresse são considerados como fatores psicossociais de risco e estão fortemente associados a maiores índices de presenteísmo (CHAPMAN, 2005).
 
As exigências colocadas pela organização de trabalho e que podem favorecer o desencadeamento de um conjunto de reações negativas e o comportamento presenteísta pode evoluir para o estresse crônico e posteriormente para a síndrome de burnout (CHAMBEL, 2005; OSHA-EU).
 
Apesar das dificuldades para sua mensuração, os custos relacionados com perda de produtividade atribuída ao presenteísmo são maiores quando comparado ao absenteísmo por doença (JOHNS, 2010; GARCÍA, 2011), podendo afetar um terço da produtividade (SHAMANSKY, 2002).
 
Atualmente, os principais elementos desestabilizadores da saúde psíquica dos trabalhadores estão relacionados com a perda da subjetividade e da qualidade dos relacionamentos. Faz-se necessária a identificação sobre os fatores desencadeantes para a preservação da saúde mental dos trabalhadores (VIU; BLASCO, 2011).
 
A necessidade de estabelecer estratégias integradas para o diagnóstico e detecção precoce de alterações na saúde, identificar as estratégias de resistência ao adoecimento (Coping) e os próprios trabalhadores doentes e presenteistas são aspectos fundamentais para o desenvolvimento de um programa preventivo.
 
Paton (2010) e Guchiek (2009), defendem a gestão de doenças, gestão de cuidados baseada em evidencias, programas de retorno ao trabalho, de gestão da deficiência e reabilitação profissional, assim como o encorajamento do trabalhador permanecer em casa quando não se sentisse bem. A abordagem mais efetiva para combater o presenteísmo é entendê-lo e correlacionar fatores de saúde e adoecimento que causam o presenteísmo (WHYSALL, 2007).
 
Ressalta-se que nos estudos encontrados as estratégias propostas para redução do presenteísmo visam o aumento da produtividade e não a saúde do trabalhador, visto que em sua maioria, as estratégias que visam a saúde do trabalhador são conflitantes com os objetivos das organizações.
 
Objetivo geral
O objetivo deste estudo é investigar a ocorrência e a prevalência de presenteísmo em uma indústria
 
Método
Estudo epidemiológico, descritivo de corte transversal, em uma população de trabalhadores de uma indústria.
 
Para a realização deste estudo utilizou-se questionário sociodemográfico e o questionário Stanford Presenteism Scale – SPS-6. Os questionários foram preenchidos pelos próprios trabalhadores durante o horário e no próprio local de trabalho.
 
O questionário sociodemográfico foi elaborado pelos autores, e utilizado  com objetivo de conhecer melhor o perfil dos participantes do estudo, assim como possibilitar a correlação com o estado de saúde percebido e o presenteísmo por doença, com este questionário obteve-se informações de aspectos: pessoal, ocupacional, hábitos de vida, estado de saúde, sintomas subjetivos.
 
A prevalência do presenteísmo foi avaliada por meio da aplicação do instrumento de validação SPS-6 (Stanford Presenteeism Scale), em 395 trabalhadores que responderam terem comparecido doentes ao trabalho. Este é um questionário do tipo-Likert com cinco modalidades de resposta que variam de: I- descordo totalmente a V- concordo totalmente. O escore deste questionário varia de 6 a 30 pontos.
 
A avaliação do presenteísmo realizada por meio do SPS-6 seguiu os critérios adotados por Koopman et al e validados por e Paschoalin et al, no qual escore entre 6-18, é considerado presenteísmo com dificuldade de se concentrar e finalizar o trabalho e escore entre 19-30, maior capacidade do trabalhador se concentrar e finalizar a atividade de trabalho apesar de doente.
 
Este estudo cumpriu os princípios éticos de pesquisa realizada com seres humanos e teve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp.
 
Resultados
Participaram deste estudo 1224 trabalhadores, destes, 395 afirmaram ter vindo trabalhar apesar de doentes. A população deste estudo é predominantemente masculina, 67% da população é casada ou vive em união estável. A média de idade dos trabalhadores é de 32 anos.
 
Pode-se observar que não houve diferença entre os sexos em relação ao comportamento presenteísta. A idade também não é um fator relevante. Em relação aos cargos, as funções que exigem maior responsabilidade ou especialização apresentaram maiores índices de presenteísmo, corroborando com outros estudos.
 
De acordo com os dados obtidos, 58% dos respondentes relataram praticar exercícios físicos regularmente. Quando correlacionada a prática de exercício físico e presenteísmo observou-se que 59,2% dos presenteístas não pratica nenhum tipo de exercício físico, as diferenças encontradas possuem significância estatística, havendo associação entre ambos.
Neste estudo foi solicitado aos participantes que informassem seu peso e altura, e a partir destas informações foi calculado o índice de massa corpórea (IMC), para posteriormente associar ao presenteísmo. De acordo com as informações obtidas, 52% da população está acima do peso, destes 13% são obesos. Observou-se que trabalhadores que estão acima do peso ou obesos são mais presenteístas do que os que estão no peso recomendado.
 
Em relação às condições de saúde autorreferidas, foram elencadas as condições de saúde crônicas mais comuns e solicitado ao participante que marcasse  a(s) condição (ões) que o afeta.
 
As condições mais referidas pela população de estudo foram dor de cabeça (17%), lesão osteomuscular (10%), problema renal e problemas de pele (ambos com 9%), os demais sintomas autorreferidos tiveram menor percentagem. As condições de saúde autorreferidas não tiveram significância estatística.
 
O resultado deste estudo é que 23% da população é presenteísta.
 
Conclusão
Houve associação significativa entre os que afirmaram não praticar atividade física e os que apresentavam sobrepeso ou obesidade.
 
Os resultados deste estudo, pioneiro em uma indústria, identificou uma prevalência de presenteismo 10 vezes superior ao absenteísmo doença registrado no mesmo estabelecimento industrial
 
A prevalência de 23% de presenteísmo na população pesquisada, embora expressiva, foi um pouco menor do que a encontrada em outros  trabalhos. De acordo com a Eurofound (2010), no setor industrial o percentual de trabalhadores presenteístas foi de 35%.
 
Faz-se necessária a implantação de programas para identificação dos fatores psicossociais relacionados ao estresse e seu manejo adequado e, bem  como discutir com a organização o estabelecimento de ações relacionados a educação alimentar e de incentivo à pratica de atividade físicas ede um novo estudo para avaliação do impacto destes programas para a saúde do trabalhador e sobre a prevalência do presenteísmo.
 
Referências
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1Mestre em Saúde Coletiva naFCM-UNICAMP.
2Doutoranda em Saúde Coletiva na FCM-UNICAMP, bolsista doCNPq-Brasil.
3Mestrando em Saúde Coletiva naFCM-UNICAMP.
4Doutora em Saúde Coletiva naFCM-UNICAMP.
5Professor doutor daFCM-UNICAMP.

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