Cabos, Soldados e seus Fatores Estressores

Edmilson Antonio Pereira Junior*

Resumo

O objetivo deste estudo foi identificar os fatores relacionados ao estresse policial, verificando os efeitos dos diferentes aspectos do trabalho policial no fato de cabos ou soldados se encontrarem ou não em situação de estresse. O estresse de 1.901 cabos e soldados da Polícia Militar de Minas Gerais foi aferido por meio do Inventário de Sintomas de Stress de Lipp (ISSL). A técnica estatística de Regressão Logística foi utilizada, inicialmente, para verificar os fatores estressores significativos dentre as características sociodemográficas e profissionais; satisfação e adequação das atividades exercidas; organização do trabalho e descanso; e relações hierárquicas. Posteriormente, foi construído um modelo único somente com as variáveis significativas. Os resultados mostram que as chances dos cabos e soldados apresentarem estresse aumentam quando existe insatisfação no relacionamento com superiores hierárquicos; insatisfação com as funções desempenhadas; ausência de recebimento diretrizes claras para a realização de suas tarefas; e a realização de trabalho além do horário de expediente normal de trabalho.

A atividade policial é desempenhada visando à manutenção da ordem pública e à garantia das leis. É submetida tanto a pressões internas, exercidas na busca do cumprimento de metas e ações, quanto a pressões externas, exercidas pela sociedade que busca reverter seu quadro de insegurança. Diante dessas demandas, recai sobre os profissionais que exercem essa atividade uma sobrecarga física e mental que impacta o estado de saúde dessas pessoas. Esse quadro é ainda agravado pela escassez de condições adequadas para o cumprimento de suas tarefas.

A reação desses profissionais às essas sobrecargas pode ocorrer de forma negativa, evidenciando transtornos e sofrimentos psíquicos cujos efeitos podem implicar situações adversas para o próprio profissional, para a instituição e, ainda, para o cidadão destinatário de suas ações. Decorre dessa situação a experiência de dor e sofrimento vivida pelos policiais; o aumento da taxa de absenteísmo assim como o não atendimento pleno e satisfatório dos cidadãos.

Nesse contexto, justifica-se o conceito de qualidade de vida. Esse conceito é abordado de forma ampla e considera as condições físicas e psicológicas, bem como o bem-estar dessas pessoas. A abrangência do termo qualidade de vida engloba fatores tais como: “relações interpessoais, valorização profissional, saúde mental, saúde e bem-estar físico, assistência social, longevidade, satisfação no trabalho, relações familiares, produtividade, dignidade e espiritualidade, dentre outros.” (PROJETO QUALIDADE DE VIDA, SENASP, 2010, p. 12)

A preocupação com a qualidade de vida dos profissionais deve ser constante nas instituições de segurança pública, buscando sempre melhorar as condições de trabalho para aprimorar a qualidade de vida daqueles que detêm a importante atribuição de aplicação de leis e manutenção da segurança dos cidadãos. O aprimoramento das condições de trabalho leva à percepção da qualidade de vida. De acordo com Minayo (SEDS, 2011, p. 8), “é um conceito que se refere à situação que precede às atividades dos sujeitos e a limita, sendo resultante dos processos sobre os quais os trabalhadores interferem em sua dinâmica de subjetivação.”

A real compreensão da situação é, então, peça fundamental para a promoção da qualidade de vida dos profissionais de segurança pública (SENASP, 2010). Dessa forma, fica evidente a importância de indicadores de saúde dos profissionais, conforme coloca Silveira (2010, p. 77): “A saúde do trabalhador constitui ainda um componente fundamental à garantia de segurança e qualidade do trabalho executado, pois impacta fortemente no desempenho das organizações, sendo a manutenção de boas condições de trabalho e de indicadores de saúde dos trabalhadores, elementos importantes dos protocolos que verificam e atestam a qualidade de produtos e processos”.

É importante ressaltar que, apenas recentemente, o investimento em estudos dá ênfase à pessoa do policial (MINAYO, 2008), o que reforça a necessidade de se incentivar a utilização de dados empíricos.

O objetivo desse estudo é investigar os fatores que influenciam a situação de estresse de policiais, vislumbrando contribuir para a qualidade de vida dos profissionais de segurança pública. Para tal são utilizados dados empíricos da pesquisa “Avaliação dos Riscos e das Condições Ambientais de Saúde dos Policiais Militares de Minas Gerais” que foi realizada junto a policiais militares de Minas Gerais. Esse trabalho buscou produzir informações estratégicas para subsidiar políticas de melhoria de qualidade de vida dos policiais militares; propiciou o avanço do conhecimento sobre essa categoria de prestadores de serviço público além de subsidiar elementos para reflexão e consequente mudança nas políticas de promoção de saúde da Corporação.

O estresse foi considerado como o foco do estudo por constituir um importante indicador de saúde. Associa-se tanto a sintomas psicológicos quanto a sintomas físicos e pode implicar queda de desempenho do indivíduo. O estresse, segundo autores nacionais e internacionais, é caracterizado como: “uma reação do organismo na qual se incluem componentes psicológicos, físicos, mentais e hormonais que ocorrem quando surge a necessidade de uma adaptação intensa a um evento ou situação de importância”. (SEDS/MG, 2011, p. 85)

A ocorrência de estresse nos indivíduos é aferida pelo Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de Lipp – ISSL (LIPP, 2000), que possibilita a verificação da ocorrência e a determinação da fase de estresse: alerta, resistência, quase exaustão e exaustão. Essa aferição é feita por meio da verificação de sintomas físicos e psicológicos percebidos pelos entrevistados.

O intuito é identificar os fatores associados ao estresse, também denominados de estressores psicossociais, que podem ser entendidos como “os valores e circunstâncias do ambiente em que o indivíduo está inserido, capazes de perturbar seu comportamento normal ou exacerbar um transtorno psíquico” (SEDS/MG, 2011, p.88). No repertório de estressores psicossociais considerados no estudo encontram-se as características sociodemográficas e profissionais dos policiais, a adequação e satisfação das atividades desenvolvidas, a organização do trabalho e do descanso e, ainda, as relações hierárquicas.

Antes de considerar os fatores estressores, é importante ressaltar que a incidência de estresse em cabos e soldados atinge 25% dos entrevistados. Esse resultado, quando comparado ao de outras categorias profissionais utilizando o mesmo inventário de aferição, é inferior ao resultado de 30% encontrado no grupo de profissionais de enfermagem de uma unidade de portadores de HIV (MIQUELI, et. al., 2004) bem como ao resultado de 53% no grupo de motoristas de transportes coletivos (BIGATTÃO, 2005) e aproxima-se do resultado de 24% registrado no grupo de guardas municipais (MUNIZ, PRIMI & MIGUEL, 2007). Apesar do grupo de policiais não figurar como o que apresenta elevadas taxas de pessoas com estresse, deve ser relevado o tipo de atividade exercida por esses profissionais que são responsáveis pelas atividades de policiamento ostensivo e que possuem o monopólio do uso legítimo da força, inclusive de armas de fogo. Sob esse aspecto, o registro de 30% de cabos e soldados que se encontram em situação de estresse pode ser considerado alto uma vez que os efeitos decorrentes dessa sobrecarga psicológica podem implicar sérios danos tanto para os policiais quanto para o público que recebe seus serviços.

Metodologia

O estudo se propõe a identificar os fatores relacionados ao estresse policial, ou seja, busca verificar quais os efeitos dos diferentes aspectos do trabalho policial no fato de cabos ou soldados se encontrarem ou não em situação de estresse. Dessa forma, configura-se como um estudo do tipo exploratório que busca descobrir relações entre fenômenos – fatores estressores e estresse – de forma a identificar os relacionamentos estatisticamente significativos e o significado dessa influência.

O inventário ISSL é utilizado para classificar os policiais entrevistados em dois grupos: profissionais que não demonstram estresse ou profissionais que demonstram estresse em algum nível. Esse instrumento aborda os sintomas verificados pelos profissionais nos aspectos físicos e psicológicos, em três períodos de tempo. O primeiro considera os sintomas verificados nas últimas 24 horas e é composto por itens que avaliam 12 sintomas físicos e 3 psicológicos. O segundo considera os sintomas ocorridos na semana anterior e é composto por itens que avaliam 10 sintomas físicos e 5 psicológicos. O terceiro considera os sintomas percebidos no mês anterior e é composto por itens que avaliam 12 sintomas físicos e 11 psicológicos.

Esse tipo de classificação é autorreferida pelos entrevistados, uma vez que os sintomas apresentados não são corroborados por análise clínica. Mesmo não sendo um diagnóstico clínico, que é mais complexo e exige o atendimento especializado de profissional de saúde, o inventário ISSL é validado e tem larga utilização por diferentes grupos de profissionais. Considerando o grande número de policiais militares incluídos no estudo, constata-se que o custo e demora de outra forma de diagnóstico inviabilizaria sua realização. Isso, então, impediria estender seus resultados a um grupo maior de profissionais.

O estudo é delineado de forma a considerar somente os cabos e soldados da Polícia Militar, uma vez que esses policiais se atêm, quase exclusivamente, ao cumprimento de ordens, diferentemente do grupo formado pelos sargentos, suboficiais e oficiais. É importante ressaltar que, numericamente, cabos e soldados constituem as categorias com o maior número de profissionais, sendo elas responsáveis por 71,4% do efetivo da Polícia Militar de Minas Gerais (Fonte: Avaliação dos Riscos Ambientais e das Condições de Saúde dos Policiais Militares de Minas Gerais, 2011, p.37).

O desenvolvimento do trabalho engloba duas fases:

1. Na primeira fase, são verificados dados estatísticos significativos de quatro grupos de fatores estressores associados ao trabalho policial. A variável analisada considera se o policial apresenta ou não estresse.

2. Na segunda fase, é construído um modelo único, incluindo todas as variáveis significativas de cada um dos quatro grupos. Isso possibilita verificar quais variáveis continuam a produzir efeito e em qual medida aumentam ou diminuem as chances dos cabos e soldados apresentarem estresse.

A técnica estatística conhecida como Regressão Logística é utilizada em ambas as fases. Essa técnica permite verificar os fatores que influenciam a variável resposta: o estresse desse grupo de profissionais. Os modelos de regressão são técnicas de análise de dados que permitem descrever a relação entre a variável resposta e uma ou mais variáveis explicativas (HOSMER; LEMESHOW, 1989). A Regressão Logística é utilizada para a especificidade de apresentar variável resposta do tipo binária – com estresse e sem estresse.

Dados utilizados

Os dados utilizados foram obtidos através da aplicação de questionário junto a 1.901 cabos e soldados da Polícia Militar de Minas Gerais no ano de 2010, por meio da pesquisa “Avaliação dos Riscos Ambientais e das Condições de Saúde dos Policiais Militares de Minas Gerais”[1](SEDS/MG, 2011). Os entrevistados são provenientes de uma amostragem por conveniência, em que foram selecionadas três unidades da Polícia Militar de Belo Horizonte e região metropolitana e outras três localizadas no interior do estado. Dentro de cada uma dessas unidades foram incluídas, na amostra, a sede e mais duas frações destacadas, o que permite abordar tanto policiais que trabalham em postos superiores (sede) quanto aqueles que trabalham em postos inferiores.

Em virtude do procedimento de amostragem utilizado, não se pode estender os resultados obtidos a todo o efetivo de cabos e soldados da Polícia Militar. Contudo, esses resultados permitem apresentar a dinâmica das unidades amostradas e apresentar um panorama geral de características da corporação.

Variáveis analisadas

As variáveis utilizadas referem-se às características e percepções dos policiais acerca de suas condições de trabalho. É considerada como variável resposta o estresse dos cabos e soldados e como variáveis explicativas, fatores relacionados às características sociodemográficas e profissionais; satisfação e adequação das atividades exercidas; organização do trabalho e descanso; e relações hierárquicas.

Situação de Estresse

Situação de estresse é a variável resposta do estudo aferida por meio do Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de Lipp – ISSL (LIPP, 2000). Os entrevistados foram classificados em dois grupos, sendo o primeiro formado por aqueles que não apresentam estresse e, o segundo, pelos que apresentam estresse em algum nível (alerta, resistência, quase-exaustão e exaustão).

Características sociodemográficas e profissionais

O tempo de serviço dos cabos e soldados é considerado em intervalos a cada 5 anos, sendo (1) Até 5 anos, (2) De 6 a 10 anos, (3) De 11 a 15 anos, (4) De 16 a 20 anos, (5) De 21 a 25 anos e (6) 26 anos ou mais.

Os tipos de atividades que exercem os policiais são divididos em: (1) Policiamento a pé, (2) Policiamento em viatura, (3) Policiamento de guardas, (4) Administrativo, (5) outros.

A idade desse grupo de profissionais é considerada nas seguintes faixas: (1) Até 25 anos, (2) De 26 a 30 anos, (3) De 31 a 35 anos, (4) De 36 a 40 anos, (5) De 41 a 45 anos, (6) De 46 a 50 anos e (7) 51 anos ou mais.

A cor da pele dos entrevistados é analisada em (1) Branca, (2) Preta, (3) Parda e (4) Amarela / indígena.

A situação conjugal dos militares pesquisados é classificada como: (1) Solteiro, (2) Casado ou vivendo junto com companheiro, (3) Viúvo e (4) Separado.

O fato de praticar alguma religião é considerado em: (1) Sim, frequentemente, (2) Sim, às vezes e (3) Não.

O grau de escolaridade contempla as categorias: (1) 1º grau incompleto, (2) 1º grau completo, (3) 2º grau incompleto, (4) 2º grau completo, (5) Superior incompleto, (6) Superior completo e (7) Pós-graduação.

Satisfação e adequação das atividades exercidas

A opinião dos policiais acerca da adequação da função às tarefas executadas no dia-a-dia é classificada em (1) Sim, (2) Nem sempre e (3) Nunca.

O grau de satisfação com as funções que desempenha é mensurado em (1) Muito satisfeito, (2) Satisfeito, (3) Nem satisfeito e nem insatisfeito, (4) Insatisfeito e (5) Muito insatisfeito.

A opinião dos cabos e soldados sobre a adequação do trabalho exercido ao treinamento por eles realizados é considerado em (1) Sim e (2) Não.

Organização do trabalho e do descanso

O horário de trabalho atual é compreendido por (1) 6 h de serviço – 6 por 1, (2) 8 h de serviço – 2 por 1 e 2 por 2, (3) 8 h de serviço – 3 por 1 e 3 por 2, (4) 10 h de serviço – 1 por 1, (5) 10 h de serviço – 24 por 48, (6) 24h por 48 h, (7) 40 h semanais com escala extra, (8) 40 h semanais sem escala extra e (9) outro tipo.

O fato dos policiais terem, nos últimos meses, realizado trabalho além do horário estabelecido é dividido em (1) Sim, muitas vezes, (2) Sim, algumas vezes, (3) Sim, poucas vezes e (4) Não.

É verificado também o fato dos cabos e soldados exercerem outra atividade remunerada, sendo (1) Sim e (2) Não.

O momento em que os militares tiraram as últimas férias na polícia é considerado como (1) Há até 1 ano atrás, (2) Há 2 anos atrás, (3) Há 3 anos ou mais e (4) Nunca tirei.

Relações hierárquicas e entre pares

O relacionamento com a chefia imediata foi avaliada em relação ao grau de satisfação dos militares como (1) Muito satisfeito, (2) Satisfeito, (3) Nem satisfeito e nem insatisfeito, (4) Insatisfeito e (5) Muito insatisfeito.

O grau de satisfação dos cabos e soldados com o relacionamento com pessoas de nível hierárquico superior é aferido em (1) Muito satisfeito, (2) Satisfeito, (3) Nem satisfeito e nem insatisfeito, (4) Insatisfeito e (5) Muito insatisfeito.

Também o relacionamento com pessoas subordinadas foi mensurado de acordo com o grau de satisfação, sendo (1) Muito satisfeito, (2) Satisfeito, (3) Nem satisfeito e nem insatisfeito, (4) Insatisfeito e (5) Muito insatisfeito.

Por fim, foi verificado se os policiais possuem o recebimento de diretrizes claras para a realização de suas atividades por meio de (1) Sim, (2) Nem sempre e (3) Nunca.

Análise dos dados

São apresentadas nessa seção, as análises referentes às duas fases já estabelecidas. A primeira etapa verifica os efeitos dos fatores estressores dentro de quatro grupos distintos e, a segunda, considera conjuntamente todos os fatores estatisticamente significativos na fase anterior. A variável resposta considerada nas duas fases afere se os cabos e soldados se encontram ou não em situação de estresse.

Primeira etapa

Na etapa inicial, os resultados são apresentados por meio de estatística Valor-p, que apresenta uma estimativa do Erro Tipo I, que em estatística diz respeito à “probabilidade de falhar incorretamente a hipótese nula – em termos simples, a probabilidade de não encontrar uma correlação ou diferença na média quando ela existe” (HAIR, 2009, p. 22). Em nosso estudo, o Valor-p é considerado ao nível de 5%, o que significa dizer que quando o valor encontrado é igual ou menor que esse valor, considera-se estatisticamente significativo a inclusão da variável no modelo.

Características sociodemográficas e profissionais

O tempo de serviço (Valor-p = 0,064), o tipo de atividade (Valor-p = 0,032), a idade (Valor-p = 0,076), a cor da pele (Valor-p = 0,005), a situação conjugal (Valor-p = 0,488), a prática de religião (Valor-p = 0,105) e a escolaridade (Valor-p = 0,030) foram consideradas em um modelo de regressão logística para o fato dos cabos e soldados possuírem ou não estresse. Desse modo, as características sociodemográficas e profissionais incluídas no modelo e consideradas significativas, sob o ponto de vista estatístico, foram o tipo de atividade desenvolvida, a cor da pele e a escolaridade dos entrevistados. Essas variáveis apresentam Valor-p menor que 0,05 e demonstram relação com o fato de os cabos e soldados se encontrarem em situação de estresse.

O trabalho realizado pelo policial militar é geralmente dividido em dois setores: setor administrativo e setor operacional. O setor administrativo é responsável pelo trabalho de gestão, pelas atividades burocráticas e pela seleção, treinamento, aperfeiçoamento e formação profissional dos servidores. Já o setor operacional é responsável pelo policiamento externo, responsável por manter a ordem pública. Contudo, é apontada uma visão concorrente entre esses grupos (SEDS, 2007, p. 61): “Porque que todas as projeções são do administrativo. Porque que todos os cursos que cegam, quem preenche primeiro é o administrativo. Pra que esse pessoal precisa fazer curso tático, treinamento tático? Pra que eles precisam? Eles trabalham na administração. E recompensa? Acho que quem tem que ter essas recompensas são os policiais da rua, é o destaque operacional.” (PM)

As variáveis tempo de serviço e idade dos cabos e soldados se associam ao acúmulo de sobrecarga, física ou psicológica, ao longo do tempo. Isto é, “na medida de seu envelhecimento, o policial acumula efeitos associados ao estresse laboral” (MINAYO, 2011, p. 2207), o que resulta em comportamento inadequado e converge para o envelhecimento precoce.

A cor da pele é considerada em função de constituir “uma marca de discriminação muito forte no país e a Corporação policial é reconhecida nacionalmente por ser um instrumento de emprego e forma de ascensão para jovens negros e pardos” (SEDS/MG, 2010, p. 24). Já quando se observa a prática de religião, o estudo de Schmidt (2004, p. 185) finaliza dizendo que “religiosidade não é garantia contra stress”.

Satisfação e adequação das atividades exercidas

Os fatores que representam o grau de satisfação e adequação das atividades exercidas, considerados no modelo de regressão logística, a adequação entre trabalho e função para a qual foi treinado (Valor-p = 0,001), grau de satisfação com as funções desempenhadas (Valor-p = 0,000) e adequação das tarefas com a função (Valor-p = 0,000). Todos foram estatisticamente significativos.

Espera-se que a adequação entre o treinamento oferecido aos cabos e soldados e a função exercida por eles seja satisfatória e que o conteúdo repassado aos profissionais contribua para a prática policial. Tratando desse nível de adequação entre capacitação e treinamento com a realidade policial, Muniz e Cordeiro (2010, p. 111) afirmam: “Se o objetivo é construir um programa de capacitação continuada para as polícias que, de fato, reflita a realidade do seu trabalho, então a identificação crítica das competências policiais para a realização de suas atribuições é de fundamental importância. Isto porque serão estas competências mapeadas que irão orientar os policiais a mobilizarem saberes aprendidos nas situações profissionais vivenciadas”.

Outro ponto a ser trabalhado pelas instituições diz respeito ao alinhamento entre o tipo de atividade exercida pelos policiais militares e o perfil do policial envolvido. Isso permite maior grau de satisfação com as tarefas executadas, constituindo-se em importante ação de valorização profissional. Nesse sentido, o processo de gestão de pessoas da instituição pode contribuir com a qualidade de vida de seus profissionais por meio da definição do perfil profissiográfico dos postos de trabalho. Esse perfil profissiográfico traz as “informações a respeito do cargo e de seus ocupantes, contendo os atributos psicológicos e físicos necessários ao desempenho satisfatório do cargo considerado” (CHIAVENATO In: Guia de Ações do Projeto Qualidade de Vida, 2010, p. 22).

Organização do trabalho e do descanso

Quatro fatores estressores foram incluídos no modelo que objetiva investigar a existência de estresse entre os policiais, o horário de trabalho (Valor-p = 0,904), a realização de trabalho além do horário (Valor-p = 0,000), a realização de outra atividade remunerada (Valor-p = 0,030) e quando tirou férias pela última vez (Valor-p = 0,000). Três desses fatores foram estatisticamente significativos: a realização de trabalho além do horário estabelecido, o exercício de outra atividade e a data das últimas férias.

Considerando a organização do trabalho e descanso, Minayo (2011, p. 9) aponta peculiaridades do trabalho policial que o distingue do setor de produção material industrial, pois existem tanto dificuldades de planejamento quanto incerteza em relação ao volume necessário. Dito de outra forma, os policiais devem estar à disposição da sociedade e não se tem certeza de quando suas intervenções serão demandadas e nem em qual intensidade será necessária.

A falta de efetivo pode acarretar acúmulo de atividades para o policial no exercício de sua função. Pode, ainda, influenciar na programação de férias dos cabos e soldados, fazendo-os a retardar o período de gozo de férias para que as ações da unidade em que estão lotados não sofram com a falta de cobertura de profissionais frente às demandas.

Relações hierárquicas

Considerando as relações hierárquicas, o modelo de regressão logística apresentou o relacionamento com superiores (Valor-p = 0,000), o relacionamento com a chefia imediata (Valor-p = 0,045) e o recebimento de diretrizes claras como estatisticamente significativos (Valor-p = 0,000). Somente o relacionamento com subordinados (Valor-p = 0,064) não apresentou significância.

A hierarquia e disciplina constituem os pilares de organização da Polícia Militar. Contudo, um relacionamento mais harmônico entre comandantes e comandados deve ser almejado. Devem ser estimuladas as capacitações de profissionais em nível de comando, em técnicas de chefia e liderança, permitindo que consigam delegar tarefas aos comandados de forma que esses se sintam respeitados e se envolvam ao máximo na obtenção de seus objetivos.

O delineamento do estudo, direcionados a cabos e soldados, restringe, de certa forma, o relacionamento com subordinados, tendo em vista que constituem a base da pirâmide dos postos ou patentes. Isso nos diz, que os cabos apresentam apenas os soldados como subordinados e esses últimos, nenhuma outro posto abaixo.

Segunda etapa

Na segunda etapa, são consideradas em um único modelo todas as variáveis estatisticamente significativas encontradas dentro de cada grupo de fatores.

Todas as características dos policiais entrevistados, utilizadas na segunda fase, produzem efeito direto no fato de apresentarem ou não estresse, em algum grau, quando analisadas de forma separada. Quando essas características são consideradas em conjunto com outras variáveis, deixam de exercer tal influência. Isso ocorre porque seu efeito é anulado através de uma ou mais variáveis incluídas no modelo de análise.

Nessa etapa, além da identificação das variáveis estatisticamente significativas (Valor-P) é apresentada também uma medida estatística que permite mensurar os resultados obtidos. Essa interpretação do modelo de Regressão Logística é feita por meio da razão de desigualdade, também conhecida como razão de chances ou odds-ratio (OR), que consiste na comparação da probabilidade de um evento acontecer com a probabilidade de o evento não acontecer (HAIR, 2009, p. 223). É importante destacar que essa estatística não se trata de uma probabilidade de ocorrência e, em termos práticos, se encontramos uma razão de chances igual a 2, isso pode ser interpretado de forma que um grupo tenha o dobro de chances de apresentar estresse, ou ainda, que a chance de um grupo apresentar estresse é 100% maior que o outro.

O modelo geral de Regressão Logística apresenta como variáveis significativas a satisfação dos policiais com o relacionamento com pessoas de nível hierárquico superior, o recebimento de comandos ou diretrizes claros para a realização das atividades, a satisfação com as atividades desempenhadas e a época em que as férias foram tiradas pela última vez (TAB. 1).

TABELA 1

Modelo de regressão logística para o fato dos cabos e soldados apresentarem ou não estresse, considerando características sociodemográficas e profissionais, satisfação e adequação das atividades exercidas, organização do trabalho e descanso e relações hierárquicas.

 Fatores

Policiais com estresse (%)

Valor-p

Exp (β)

Satisfação com o relacionamento com pessoas de nível hierárquico superior

 

0,009

 

Muito satisfeito

15,0%

 

 

Satisfeito

19,5%

0,855

1,042

Nem satisfeito, nem insatisfeito

36,6%

0,102

1,520

Insatisfeito

48,9%

0,049

1,975

Muito insatisfeito

75,8%

0,006

4,764

Recebimento de diretrizes/comandos claros para realização das atividades

 

0,043

 

Sim

18,7%

 

 

Nem sempre

38,5%

0,013

1,434

Nunca

31,9%

0,456

1,373

Tipo de atividade

 

0,435

 

Policiamento a pé

29,5%

 

 

Policiamento em viatura

27,6%

0,922

0,969

Policiamento de guardas

20,8%

0,950

0,970

Administrativo

30,6%

0,300

1,446

Policiamento ostensivo geral: a pé, viatura e guarda de cadeia

27,8%

0,720

0,886

Outro

15,4%

0,752

0,899

Cor da pele

 

0,078

 

Branca

30,9%

 

 

Preta

25,1%

0,476

0,856

Parda

22,0%

0,010

0,696

Amarela / Indígena

33,3%

0,652

0,762

Escolaridade

 

0,844

 

1o grau incompleto

32,4%

 

 

1o grau completo

25,8%

0,773

0,855

2o grau incompleto

32,0%

0,652

1,263

2o grau completo

22,6%

0,992

0,995

Superior incompleto

27,2%

0,771

1,152

Superior completo

29,8%

0,661

1,248

Pós-graduação

22,2%

0,791

0,824

Adequação do trabalho exercido ao treinamento

 

0,349

 

Sim

22,0%

 

 

Não

40,8%

0,349

1,188

Satisfação com as funções desempenhadas

 

0,000

 

Muito satisfeito

17,4%

 

 

Satisfeito

20,8%

0,929

1,016

Nem satisfeito, nem insatisfeito

38,4%

0,018

1,725

Insatisfeito

60,7%

0,000

3,152

Muito insatisfeito

62,1%

0,082

2,405

Adequação das tarefas com a atividade/função

 

0,207

 

Sim

18,7%

 

 

Nem sempre

36,7%

0,063

1,317

Nunca

36,0%

0,854

1,113

Não sei responder

37,3%

0,168

1,704

Trabalho além do horário estabelecido

 

0,000

 

Sim, muitas vezes

36,1%

 

 

Sim, algumas vezes

24,9%

0,001

0,630

Sim, poucas vezes           

15,0%

0,000

0,407

Não

15,2%

0,013

0,548

Exerce com regularidade outra atividade remunerada

 

0,213

 

Sim

39,0%

 

 

Não

24,0%

0,213

0,738

Últimas férias

 

0,087

 

Há até 1 ano atrás

30,3%

 

 

Há 2 anos atrás

22,7%

0,909

0,953

Há 3 anos ou mais

13,3%

0,343

0,451

Nunca tirei

12,9%

0,016

0,599

Satisfação com o relacionamento com a chefia imediata

 

0,316

 

Muito satisfeito

18,4%

 

 

Satisfeito

22,9%

0,961

0,991

Nem satisfeito, nem insatisfeito

42,0%

0,230

1,328

Insatisfeito

42,3%

0,414

0,720

Muito insatisfeito

73,7%

0,313

1,967

Fonte: Banco de dados da pesquisa “Avaliação dos Riscos Ambientais e das Condições de Saúde dos Policiais Militares de Minas Gerais” – SEDS/MG, 2011.

A interpretação de cada fator significativo, sob o ponto de vista estatístico, é apresentada a seguir:

Relacionamento com superiores hierárquicos

A satisfação do relacionamento entre cabos e soldados com seus superiores hierárquicos apresenta uma associação direta com o nível de estresse: maior grau de satisfação/menor nível de estresse. Em termos de razão de chances de ocorrência de estresse, pode ser verificado que a chance daquele que não ficou satisfeito e nem insatisfeito com o relacionamento com os superiores é cerca de 50% maior (OR = 1,520) do que aqueles que ficaram muito satisfeitos (TAB. 1).

Quando se compara os insatisfeitos e os muito insatisfeitos, as chances de entrarem no grupo dos que apresentam estresse aumentam em 98% e 376%, respectivamente.

Em termos descritivos, o grupo dos muito satisfeitos com o relacionamento com os superiores hierárquicos apresentou apenas 15% dos entrevistados com estresse, passando por 36,6% sem estresse junto àqueles que se posicionaram indiferentes nessa situação, até chegar a 75,8% de profissionais sem estresse quando se considera o grupo que se sente muito insatisfeito com o relacionamento com seus superiores (TAB. 1).

A Polícia Militar é uma instituição construída sobre os pilares da hierarquia e disciplina, ficando clara a posição de comandantes e comandados. Contudo, quando se analisa a situação de cabos e soldados, que formam a base da pirâmide em termos de hierarquia, esse relacionamento com superiores é apontado como fonte de diminuição da motivação dos policiais e de aumento do sentimento de injustiça (SEDS, 2007, p. 46): “O meu grau de satisfação mudou, caiu, por causa disso daí. Não estar no lugar que gostaria igual ele falou, é o meu caso. E isso é uma forma de punição. (...) Tem pessoas que não me vêem com bons olhos. Tem pessoas como ele que tá tudo certo, tudo certo, que é uma festa, mas pra mim não é assim. Eu via as coisas acontecendo e bati de frente. Você é sargento eu sou soldado, mas isso que você está fazendo tá errado. Quem fica nessa posição é punido por isso. Eu falava e não era ouvido.” (PM)

Ainda nesse sentido, Minayo [et al.] (2008) apontam que dentro da mesma corporação policial existe “uma radical separação entre quem manda e quem deve obedecer”, evidenciando o afastamento entre oficiais e praças.

Por outro lado, em estudo sobre a saúde mental e trabalho policial junto a capitães, Spode e Melo (2005) mostram que nesse grupo de policiais recai a responsabilidade pelos mecanismos de produção e manutenção da hierarquia e disciplina. Eles [os capitães] fazem a vigilância e a fiscalização do trabalho e da disciplina dos subordinados, sob pena de que eles próprios sejam punidos, caso deixem de comunicar quaisquer atos contrários.   

Recebimento de diretrizes claras

A ausência de diretrizes claras para a realização das tarefas pelos cabos e soldados contribui para o aumento da incidência de estresse nesse grupo de profissionais (TAB.1). Entre aqueles policiais que afirmam que nem sempre (OR = 1,434) ou nunca (OR = 1,373) recebem diretrizes claras, suas chances de virem a se enquadrar no grupo com estresse é 43% e 37%, respectivamente, maior do que quando se considera aqueles cujas diretrizes recebidas são claras.

Descrevendo os percentuais de profissionais com estresse e sem estresse encontrados para cada situação, aqueles que recebem diretrizes claras para executarem suas funções apresentam uma incidência de 19% de entrevistados com estresse, inferior ao grupo dos que nem sempre (38%) e dos que nunca (32%) recebem com clareza esses comandos (TAB. 1).

A preocupação com o público interno não tem sido demonstrada nos cursos de formação e capacitação destinados aos policiais. A própria Matriz Curricular Nacional (2008) sugere à formação desses profissionais apenas 6% do tempo destinado às Relações Humanas, que dentre outras coisas vem abordar questões como liderança e gerência e estratégias para desenvolvimento de equipes e times de trabalho. Também consta no Relatório de Atividades de 2007 a 2010 da Superintendência de Avaliação e Qualidade da Atuação do Sistema de Defesa Social (SASD), que, dentre o conjunto de capacitações realizadas no período, somente um evento destinado ao público interno foi realizado (Seminário de Gestão de Recursos Humanos da Polícia Militar). Nesse curso foram capacitados 320 policiais, de um total de 18.298 capacitados.

Satisfação com as funções

A insatisfação com as funções desempenhadas pelos cabos e soldados contribui para o estresse desses profissionais. Os militares que não se encontram satisfeitos com suas funções aumentam consideravelmente suas chances de se encontrarem em nível de estresse. Aqueles que não se encontram nem satisfeitos nem insatisfeitos aumentam em 73% suas chances de se sentirem estressados e os insatisfeitos (OR = 3,152) e os muito insatisfeitos (OR = 2,405) aumentam essas chances em 215% e 140%, respectivamente (TAB. 1).

Descritivamente, foram encontrados 62% de cabos e soldados com estresse no grupo daqueles muito insatisfeitos com as funções que desempenham. Valor bem superior aos 17% de profissionais com estresse, considerando aqueles muito satisfeitos com as funções desempenhadas (TAB. 1).

O alinhamento de funções e aptidões é apontado como sendo fator que interfere no nível de estresse dos policiais, reforçando a necessidade da construção de perfil profissiográfico para os cargos da instituição. Conforme cita o Guia de Ações do Projeto Qualidade de Vida da SENASP (2010, p. 22), essa ferramenta gerencial básica permite: “seleção de profissionais que possuem as características necessárias ao bom desempenho no cargo, evitando o desgaste de profissionais sem as características necessárias; solução de déficits na atuação profissional, delimitando tarefas inerentes ao cargo e servindo de base ao diagnóstico de necessidades de formação e capacitação; planos de cargos e salários compatíveis com as funções realizadas, gerando satisfação funcional; levantamento de situações indesejáveis, indicando aspectos que deveriam ser sanados”.

Essa inadequação entre determinadas atividades e os profissionais que as realizam é apontada por um policial militar, na pesquisa Saúde dos Profissionais do Sistema de Defesa Social (SEDS, 2007, p. 90): “Eu acho que bom mesmo pra saúde é tentar adequar ao máximo aquele militar às atividades que ele gosta. É um estresse, ele não gosta, ele não vai render, sendo que ele podia ficar num lugar que ele gosta, ia render mais”. (PM)

Contudo, existe estresse mesmo naquele grupo de profissionais que se encontram atendidos com as funções que desempenham, sendo registrados 21% entre os satisfeitos e 17% entre os muito satisfeitos. Em estudo que verifica essa relação entre estresse e satisfação profissional junto a um grupo de professores, Rossa (2004) aponta que “essa ‘compatibilidade’ entre o stress e a satisfação profissional pode estar relacionada a diversos fatores, como a fase do stress e a capacidade de adaptação individual ao stress.”

Trabalho além do horário

A realização de trabalho além do horário de expediente normal de trabalho apresenta associação com o estresse dos policiais (TAB. 1). É verificado que um profissional que algumas vezes trabalhou além do horário estabelecido apresenta 37% (OR = 0,630) a menos de chances de se encontrar em situação de estresse do que aquele que trabalhou muitas vezes depois do expediente. Já para aqueles que não ficaram além do horário estabelecido, as chances de entrarem para o grupo com estresse é 45% (OR = 0,548) menor do que a de quem trabalho muitas vezes além do horário.

Em termos de frequência, os cabos e soldados que não trabalharam além do horário estabelecido apresentaram uma incidência de estresse em 15% dos entrevistados, o que representa menos da metade (36%) daqueles que muitas vezes precisaram trabalhar além do horário, nos meses anteriores (TAB. 1).

O excesso de trabalho é percebido pelos militares e eles apontam a falta de pessoal como um dos motivos para a sobrecarga (SEDS, 2007, p. 93): “Quando se cria um batalhão, hoje, eles tiram o efetivo mínimo de outra companhia, então tira do efetivo do outro. Isso não é bom pra sociedade e ela fica feliz. ‘Que beleza, vai ter mais um batalhão!’ Mentira! O efetivo é o mesmo. Sobrecarrega. Fica com menos efetivo, tem que aumentar o administrativo. Nós, policiais, trabalhamos dobrado. Chego lá e tem uma ocorrência e não posso ir atender. Não tem contingente. Isso beneficia alguém do setor público! Não a sociedade, nem nós aqui, policiais militares.” (PM)

Destaca-se, então, o papel dos departamentos de recursos humanos, responsáveis pelo monitoramento do expediente de trabalho dos policiais e por identificar as características que podem impactar em sobrecarga dos policiais, como a recorrência de determinado tipo de afastamento, de concentração em determinada região, dentre outros aspectos.

Considerações finais

A proposição de políticas públicas destinadas à valorização do profissional de segurança pública mostra-se essencial para diminuir a taxa de profissionais com algum nível de estresse. O efeito do estresse pode implicar situações adversas para o próprio policial, para a instituição e, ainda, para o cidadão, destinatário de seus serviços. Inicialmente, o estresse pode causar dor e sofrimento para esses indivíduos. Considerando a corporação policial, as taxas de absenteísmo podem ser elevadas quando não se consegue tirar policiais dessa situação de estresse. Em última instância, o policial em face de alguma situação de estresse pode ter prejudicada sua atuação junto aos cidadãos, devido à perda de capacidade de manutenção de calma e paciência.

A gestão pública voltada para esses profissionais deve estar atenta ao fato de que a incidência de estresse nesse grupo de profissionais implica prejuízos para a instituição. Isso pode ser revelado pelo não cumprimento de seus objetivos, considerando os indicadores de criminalidade e, sobretudo, os indicadores de confiança da população na polícia. Dessa forma, deve ser reconhecida a necessidade de investimento em estruturas de saúde para atendimento dos policiais que se encontram em situação de estresse. No entanto, isso não é suficiente se não forem tomadas medidas preventivas que possam diminuir o efeito de fatores estressores.

Em termos de tratamento do stress emocional, é necessário identificar e trabalhar na causa da tensão, e isso deve ser realizado dentro de um contexto psicoterápico (Lipp, 2004, p. 53). Deve-se focar a prevenção desses sintomas e levar-se em consideração o contexto em que esses profissionais realizam suas atividades. Ações institucionais devem ser implementadas para que se minimize o efeito dos fatores estressores. Em termos da ocorrência do estresse, “deve-se enfatizar que ele é quase sempre reversível” (Lipp, 2004, p. 57), em que ações proativas podem não apenas evitar que aqueles que não apresentam estresse passam a tê-lo, mas também diminuir o grupo dos policiais que possuem estresse.

Por fim, cumpre-se ressaltar que o investimento na qualidade de vida desses profissionais pode fazer com que todos ganhem, uma vez que, de acordo com o Guia de Ações do Projeto de Qualidade de Vida (2010, p. 12), “o cidadão se torna mais feliz e motivado e o governo e as organizações passam a contar com mais qualidade e eficiência no trabalho de seus profissionais, o que permite reverter todo o processo em melhores serviços para a sociedade.”

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*Diretor de Avaliação do Sistema de Defesa Social de Minas Gerais, bacharel em Estatística e mestre em Sociologia.


[1]Essa avaliação foi realizada junto a um público de 2.502 policiais militares, incluindo os sargentos, sub-oficiais e oficiais. Contudo, somente são considerados nesse estudo os 1.901 cabos e soldados entrevistados, por razões mencionadas no texto.

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